A violência obstétrica ainda é um tema delicado no Brasil: identificá-la não é uma tarefa fácil e as denúncias são ainda menos comuns. No entanto, não raro pessoas que dão à luz são colocadas em condições degradantes e, em alguns casos, efetivamente violentas pela equipe de saúde que deveria priorizar seu cuidado.
Nesse contexto, os debates sobre o parto humanizado ganham tração. Afinal, o que significa “humanizar” a experiência do parto? Será que a diminuição dessa prática ao parto em casa ou ao uso de uma banheira não acaba prejudicando a saúde física e psicológica de quem passa pela gestação?
Aqui, você tira todas as suas dúvidas sobre o parto humanizado, além de conhecer dados atualizados sobre o assunto. Você também aprende a abordar esse tema na redação e confere um exemplo de redação pronta sobre ele. Continue lendo e confira!
O que é parto humanizado?
O parto humanizado está intimamente relacionado ao tipo de assistência que uma pessoa que vai dar à luz recebe. Isso significa que as escolhas dessa pessoa são ouvidas, priorizadas e respeitadas, e que a tomada de decisão não fica restrita à equipe médica.
Durante a gestação e no momento do parto, há o risco de uma série de intercorrências que colocam em risco a vida do bebê e do seu responsável. Nesses cenários, o parto humanizado considera fundamental não só que a pessoa dando à luz tenha todas as informações sobre o que está acontecendo com o seu corpo, como também que suas escolhas e decisões sejam levadas em consideração antes que se implemente qualquer solução.
Esse tipo de prática de cuidado leva em consideração três pilares fundamentais:
- O protagonismo da pessoa que está parindo, deixando que ela participe ativamente desse momento, em vez de ficar à mercê da equipe médica;
- Uma visão do parto que considera também os aspectos emocionais, sociais e culturais daquele momento, para além dos aspectos biológicos;
- As evidências científicas para a prática médica.
Qual a diferença entre o parto normal e o parto humanizado?
O parto humanizado em nada tem a ver com a via de parto, ou seja, se ele é vaginal (também conhecido como “parto normal”) ou cesárea. Nesse sentido, um parto normal pode ou não ser humanizado.
Não raro, ouvimos “histórias de terror” sobre o parto normal. Isso acontece não só pela dor intrínseca ao parto, mas também pelas violências cometidas contra a pessoa gestante durante esse momento. O objetivo do parto humanizado é, nesse contexto, impedir que essas violências aconteçam e que a experiência de parir seja positiva para todos os envolvidos.
Existe cesariana humanizada?
De modo geral, não. Afinal, por se tratar de um procedimento cirúrgico, a assistência à parturiente fica “restrita” aos momentos após o nascimento.
Nesse sentido, a humanização do parto se dá através da garantia de acompanhante, da manutenção do silêncio, da permissão do contato entre mãe e bebê assim que este nasce, da amamentação durante a primeira hora de vida, entre outras práticas. Desse modo, garante-se também o bem-estar e o protagonismo da pessoa gestante durante esse processo.
- Leia também: Redação pronta: A questão do aborto no Brasil
A questão da violência obstétrica
A pesquisa Nascer no Brasil, realizada com o apoio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e de outras instituições de saúde brasileiras, lançou luz sobre a realidade das pessoas que passam pelo parto no nosso país.
De acordo com os dados, apenas 5% das pessoas entrevistadas tiveram um parto normal sem intervenções, contra 43% que sofreram algum tipo de intervenção durante o parto vaginal. As pesquisadoras observaram, nas redes públicas e privadas, a adoção de um modelo de atenção altamente medicamentoso e que ignora evidências científicas atuais, submetendo as gestantes a:
- Limitação de movimentos durante o trabalho de parto, isto é, restrição ao leito, sem estímulo para caminhadas ou outras posições, que podem aliviar as dores das contrações e facilitar a expulsão do bebê;
- Impossibilidade de se alimentar durante o trabalho de parto, mesmo quando ele tem longa duração;
- Uso de medicamentos para acelerar as contrações e fazer com que a expulsão do bebê aconteça mais rápido;
- Episiotomia, isto é, o corte entre a vagina e o ânus, bastante doloroso e, em geral, desnecessário, usado como “alternativa” para que o bebê nasça mais rápido;
- Manobra de Kristeller, situação em que a pessoa gestante é colocada de costas e dá à luz enquanto alguém faz pressão sobre a sua barriga, “empurrando” o bebê.
Essas intervenções, quando não indicadas clinicamente, geram mais dor e mais desconforto à pessoa gestante. Além disso, podem afetar negativamente a sua recuperação e a saúde do bebê.
Mesmo nos casos em que essas pessoas não sofrem violências físicas, o parto vaginal ainda pode ser marcado pelas violências psicológicas. Não raro, há relatos de pessoas que tiveram seus corpos subjugados a comentários machistas e sexistas; que ouviram gritos da equipe médica para que “parassem de exagero”; que foram medicadas sem o seu consentimento e a sua ciência, entre outros.
O parto humanizado, nesses contextos, coloca em xeque esse tipo de violência, priorizando o bem-estar dos pacientes. Nesse sentido, dá mais liberdade e autonomia para a pessoa gestante, bem como a mantém informada das ações necessárias — como intervenções físicas, internações, uso de medicamentos etc. — para que o parto aconteça sem intercorrências.
O incentivo às cesáreas: outra forma de violência
Os partos cesarianos são os mais realizados no Brasil: cerca de 52% das pessoas optam por essa via de parto no setor público, e 88% no setor privado, ainda de acordo com a pesquisa Nascer no Brasil (Fiocruz).No entanto, na maior parte dos casos, não há justificativa clínica para esse tipo de parto.
As cesáreas não só impedem o protagonismo da pessoa gestante durante o trabalho de parto, como também têm implicações físicas tanto para a parturiente, quanto para o bebê. Pesquisas recentes apontam que a cesárea pode aumentar os riscos de morbidade e mortalidade da criança. Além disso, pode impactar o seu desenvolvimento futuro, aumentando as chances de desenvolver doenças crônicas, como diabetes, alergias, asma e obesidade.
No caso dos partos realizados no Sistema Único de Saúde, o grande índice de cesáreas também implica em um aumento desnecessário dos gastos com saúde pública. Afinal, a cesárea é um procedimento cirúrgico, com maiores chances de complicação, e que, portanto, usa mais recursos hospitalares — mesmo que não haja indicação médica.
Então por que realizá-la? E mais: por que incentivá-la, mesmo quando a opção do parto normal é mais segura e mais saudável na maior parte dos casos? A resposta está na ausência de uma preocupação com o parto humanizado.
As cesáreas são uma forma eficaz de acelerar o trabalho de parto, uma vez que não é preciso esperar o tempo de contração e expulsão do bebê. Além disso, para as instituições privadas, elas são uma excelente fonte de lucro — já que demandam mais estrutura e, portanto, mais gastos da família.
É claro que, em alguns casos, elas são necessárias. No entanto, também é preciso ter em mente que elas são um reflexo de uma lógica da produtividade e da aceleração, que ignora o cuidado e foca somente nos “resultados” — nesse caso, no fim do processo, quando o bebê já nasceu.
E se eu sofrer violência obstétrica? Posso denunciar?
Sim. A violência obstétrica pode ser denunciada em qualquer delegacia de polícia. No entanto, identificá-la e comprová-la pode não ser tão simples, o que desestimula a prática e mantém os índices oficiais baixos. Como consequência, o debate sobre o parto humanizado e os direitos da pessoa gestante também fica estagnado.
No Rio de Janeiro, por exemplo, entre os anos de 2019 e 2024, dados da Defensoria Pública indicam que apenas 36 casos de violência obstétrica foram registrados.
Mesmo nesses casos, contudo, a violação que acontece antes, durante ou depois do parto não necessariamente configura crime. Afinal, o crime de violência obstétrica não está previsto no Código Penal. Assim, é preciso enquadrar a “má conduta” em crimes já existentes, como a lesão corporal, a ameaça, a ofensa à honra e a omissão de socorro.
A Lei do Acompanhante
A Lei nº 11.108, promulgada em 2005, tem como objetivo reduzir os casos de violência obstétrica e promover a humanização do trabalho de parto. Por isso, garante às pessoas parturientes o direito à presença de um acompanhante de sua escolha durante o trabalho de parto, no parto e no pós-parto imediato.
O não cumprimento da lei, no entanto, ainda é comum em alguns hospitais, deixando a pessoa gestante em situação de vulnerabilidade. Afinal, durante o trabalho de parto, a sensação de dor e a privação de alimento, sono e movimentação pode contribuir para que a parturiente aceite intervenções que seriam, a princípio, desnecessárias.
A pesquisa Nascer no Brasil observou também que a presença de outra pessoa durante esses momentos não impede que essas violências aconteçam: embora 75% das pessoas entrevistadas tenham tido acompanhantes em algum momento do parto, os números de intervenção ainda são significativos.
Como falar de parto humanizado na redação?
O parto humanizado é um assunto que pode gerar inúmeras discussões, o que o torna um excelente tema de redação. No entanto, para construir uma tese e discuti-lo, é preciso compreender a fundo os debates que ele suscita e como se posicionar dentro deles.
Isso significa que, embora você deva usar dados na redação para embasar o seu ponto de vista, também é fundamental focar em construir um bom repertório sociocultural sobre o tema. Para te ajudar, aí vão algumas recomendações:
- O renascimento do parto (2013): Neste documentário, acompanhamos discussões sobre as diferentes questões que envolvem o trabalho de parto e a violência obstétrica.
- Nascer: parto humanizado no Brasil (2023): O documentário foca no protagonismo de pessoas que dão à luz, mostrando como o parto humanizado atua para que esse momento seja benéfico para todos os envolvidos.
- Da dor, à luz (2019): Neste documentário, acompanhamos os relatos de pessoas que sofreram algum tipo de violência obstétrica antes, durante ou depois do parto.
- O segundo sexo (1949): O livro, publicado por Simone de Beauvoir, discute o papel da mulher na sociedade. Será que a nossa única função é parir? E, nesse caso, será que precisamos ser destituídas de personalidade para cumprir um papel social?
Exemplo de redação sobre o tema: Desafios para promover o parto humanizado no Brasil
Agora, leia uma redação pronta sobre o tema “Desafios para promover o parto humanizado no Brasil“:
Em 2010, a Fundação Perseu Abramo divulgou um estudo que mostra como está a violência obstétrica no Brasil: uma em cada quatro mulheres já foram vítimas desse fenômeno. Por conseguinte, esse dado demonstra como o momento do nascimento sofreu um processo de perda da sua importância emocional em prol de uma visão técnica e apática. Sob tal ótica, a falta do parto humanizado prejudica gravemente os direitos e [9] bem-estar da mãe, mesmo assim ainda há desafios para a sua plena efetivação, como a ineficiência do Estado e o despreparo dos profissionais de saúde. [3]
Inicialmente, a precariedade do Sistema Único de Saúde (SUS) colabora para a automatização do parto. De acordo com o Ministério da Saúde, em 2015, 55% dos nascimentos aconteceram por cesáreas. Diante disso, esse número elevado mostra que há a utilização de processos invasivos na parturiente sem que haja a real necessidade, porém [4] apenas por serem capazes de gerar uma maior facilidade e velocidade para os médicos e enfermeiros. Nesse sentido, a insuficiência de investimentos do poder público reduz o número de profissionais atuantes e de salas disponíveis, o que causa uma sobrecarga na demanda e, consequentemente, a busca por um processo mais prático para o obstetra, porém [1] que costuma não respeitar os direitos e desejos da mãe.
Outrossim, a visão apenas objetiva da gestação pelos agentes de saúde retira a humanidade desse processo. Conforme consta no juramento de Hipócrates, comumente realizado no fim da graduação de medicina, a função desse profissional é ajudar o paciente e nunca causar-lhe mal. Todavia, o que ocorre na realidade brasileira distancia-se do plano teórico, porquanto o ensino ministrado pela [2] cursos de saúde foca mais na parte científica de como funciona a fisiologia dos indivíduos, mas negligencia a perspectiva mais afetiva, que vê o outro como um ser dotado de emoções e vontades. Dessarte, a parturiente passa a ser vista como um objeto de trabalho, o que causa a negligenciação da sua opinião e a imposição do método do médico, o que caracteriza a violência obstétrica. [5] [6] [7]
É mister, portanto, tomar medidas que promovam uma maior participação das mulheres nas escolhas sobre o próprio parto. Logo, cabe ao Poder Legislativo municipal proporcionar melhores condições de natalidade para as mulheres, por meio da criação de uma lei que aumente o percentual mínimo da verba governamental que deve ser destinada à saúde. Ademais, esses recursos serão utilizados para a contratação de mais médicos e para criar um curso voltado para obstetras, no qual eles receberão aulas sobre os danos que um parto desumanizado pode causar na grávida. Espera-se, assim, melhorar as condições de atendimento no SUS e treinar profissionais para serem mais empáticos e respeitosos. [8] [10]
Comentários sobre a correção da redação
Veja os comentários do corretor sobre a redação.
Competência I: demonstrar domínio da norma culta
- [1] Esta palavra deve ser retirada.
- [2] Atenção! Os trechos do período devem concordar entre si em número e em pessoa. Falha no gênero e número (masculino e plural).
Competência II: compreender a proposta
- [3] Seu parágrafo introdutório explana o recorte temático, mostrando que compreendeu a proposta.
- [7] Excelente! Retomou o primeiro argumento mencionado no parágrafo inicial e trouxe uma fonte para confirmá-lo.
Competência III: selecionar e relacionar argumentos
- [5] Ótimo argumento, muito bem!
- [6] Esse argumento ficou muito bem relacionado à temática, parabéns!
Competência IV: conhecer os mecanismos linguísticos para a construção da argumentação
- [4] Uso indevido do conectivo, procure estudar seu significado e relação no texto.
- [10] Não houve inadequação no uso de conectivos, nem repetição de palavras, o que contribuiu para a leitura fluida e agradável da redação. Muito bem!
Competência V: elaborar a proposta de intervenção para o problema
- [8] Excelente! Você resolveu os problemas apresentados na argumentação e, ainda, compreendeu muito bem o que é necessário conter na proposta de intervenção.
Comentário final
Olá! Veja alguns apontamentos e sugestões para corrigir falhas ocorridas no texto e, consequentemente, aumentar a nota. Demonstrou muito bom domínio da norma culta, mas ainda ocorreram alguns desvios no texto. Atente-se para evitá-los. Compreendeu a proposta e escreveu sobre o tema. A argumentação ficou bem desenvolvida e com embasamento teórico, demonstrando bom repertório sociocultural. Muito bom o uso de conectivos intra e entre parágrafos. A proposta de intervenção ficou completa e bem elaborada. Continue praticando! Sucesso!
Nota: 960
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