Embora o Enem seja a porta de entrada para diversas universidades do país, algumas instituições de ensino superior têm vestibular próprio. É o caso da Universidade de São Paulo (USP), que realiza seu processo seletivo pela Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest).
Nesse texto, iremos te apresentar tudo sobre a redação, que é cobrada na 2ª fase da Fuvest: estrutura do texto, particularidades, diferenças em relação ao modelo do Enem e modelos para te ajudar na inspiração! Vamos lá?m
Como é a redação Fuvest?
Antes de começar, frisamos que as informações aqui apresentadas estão na versão mais recente do Guia de Provas da Fuvest, divulgado em agosto de 2024.
O gênero textual cobrado na prova é o dissertativo-argumentativo. Para ter um bom desempenho, você deve elaborar introdução, desenvolvimento e conclusão, além de demonstrar capacidade para argumentar, expor ideias, exemplos e opiniões que sustentem sua tese.
Segundo a Fuvest, na redação, o candidato precisa:
- Demonstrar capacidade de mobilizar conhecimentos e opiniões;
- Argumentar de forma coerente e pertinente;
- Articular eficientemente as partes do texto e expressar-se de modo claro, correto e adequado.
Confira um passo a passo geral sobre a estrutura do texto dissertativo-argumentativo do exame:
Introdução
A introdução é a porta de entrada do texto e o primeiro contato que o examinador tem com suas ideias. Ela é parte fundamental do processo de credibilidade para o texto.
Nela, é importante contextualizar o tema e apresentar sua tese. Também é desejável introduzir um repertório sociocultural relacionado ao tema.
Desenvolvimento
No desenvolvimento, o candidato precisa fundamentar a tese defendida, usando os mecanismos adequados para detalhar a argumentação. Com dados e exemplos, tente responder porque e como ocorre a situação retratada no tema da redação.
Aqui, também é recomendado utilizar repertórios culturais e históricos, a fim de demonstrar que você possui conhecimentos adicionais sobre o tema – e consegue relacioná-los à problemática abordada.
Conclusão
Conforme também veremos mais adiante, a depender da proposta, a Fuvest pode não solicitar, necessariamente, uma proposta de intervenção para o assunto em questão.
Portanto, com ou sem proposta de resolução, lembre-se de finalizar o seu texto de maneira coerente com as ideias que você abordou, fechando o seu raciocínio com “chave de ouro”!
Quantos parágrafos tem a redação?
É recomendável escrever de 4 a 5 parágrafos na redação, atentando-se ao limite de 30 linhas. Além disso, o mínimo de linhas exigidas é 20.
Precisa de título na redação da Fuvest?
No topo da folha de redação, o vestibular paulista costumava inserir uma linha específica para o candidato redigir o título da redação. Porém, na edição mais recente do processo seletivo, ou seja, na Fuvest 2024, a obrigatoriedade do título não foi mencionada nas orientações contidas no caderno da prova (confira nas imagens abaixo).
Portanto, nossa recomendação é: atente-se às instruções do comando da proposta de redação! Caso o título seja obrigatório no texto, essa informação estará sinalizada na folha de orientações para a redação, junto às demais regras.
Como a redação é avaliada?
Durante a avaliação do texto, os corretores levam em consideração três competências centrais:
1. Desenvolvimento do tema e organização do texto dissertativo-argumentativo
Primeiramente, verifica-se se o texto é adequado ao tema proposto. O candidato deve demonstrar compreensão da proposta e, se houver coletânea, saber relacionar as ideias dos textos fornecidos.
O desenvolvimento do tema deve incluir informações pertinentes e progressão temática, além de revelar capacidade crítica e argumentativa. A paráfrase dos elementos da proposta não é recomendada, assim como uma dissertação meramente expositiva que apenas apresenta dados sem um ponto de vista sustentado por argumentação consistente.
2. Coerência dos argumentos e articulação das partes do texto
A coerência refere-se à capacidade do candidato de organizar e relacionar argumentos de forma lógica, evitando contradições e falta de encadeamento das ideias. A coesão envolve a correta articulação das palavras, frases e parágrafos, com o uso adequado de conectivos e o estabelecimento de relações semânticas entre as partes do texto.
A falta de planejamento, uso de senso comum, e conclusões inadequadas são aspectos negativos a serem evitados.
3. Correção gramatical e adequação vocabular
São examinados aspectos gramaticais como ortografia, morfologia, sintaxe e pontuação, além do uso adequado e expressivo do vocabulário. Espera-se que o candidato exponha seus argumentos com precisão e concisão, evitando clichês e frases feitas. Também é avaliada a seleção do vocabulário apropriado ao tipo de texto exigido.
Qual a nota máxima da redação Fuvest?
A redação da Fuvest vale 50 pontos no total. Entenda a regra adotada pela banca examinadora:
“Para cada um dos três aspectos, cada avaliador atribui, independentemente, pontuação de 1 a 5. Quando os pontos atribuídos pelos dois avaliadores a um determinado aspecto divergirem em 1 ponto, valerá a média das duas notas.
Se a discrepância entre os dois avaliadores exceder 1 ponto em qualquer dos três aspectos, a redação será objeto de terceira avaliação por banca designada para esse fim. Caberá a essa banca decidir qual das duas notas é a mais adequada ou se cabe atribuir uma terceira nota, diversa das que foram atribuídas. Neste caso, prevalecerá a terceira nota”.
Por fim, os pontos de cada um dos três aspectos serão multiplicados por 4, 3 e 3, respectivamente. O resultado é uma nota ponderada para a redação, que será de 10 a 50 pontos.
Qual a diferença entre a redação do Enem e da Fuvest?
Assim como o Enem, a Fuvest exige dos participantes a produção de um texto dissertativo-argumentativo. Contudo, no vestibular da USP, ao contrário do Enem, a proposta de intervenção pode não ser obrigatória, a depender do tema cobrado.
Além disso, enquanto o Enem cobra cinco competências na avaliação do texto, o vestibular paulista cobra três, conforme abordamos na seção anterior: “Como é a redação Fuvest?”.
Em relação aos temas cobrados, as propostas da Fuvest são conhecidas por terem um enfoque mais subjetivo, o que pode parecer desafiador à primeira vista. Já no Enem, os temas costumam ser mais amplos, passando por esferas políticas e sociais, por exemplo.
O que zera a redação da Fuvest?
Naturalmente, uma das preocupações dos candidatos é não ter a sua prova zerada. Então, é importante ter em mente o que não fazer na redação da Fuvest, para evitar uma nota indesejada, não é? Confira os casos em que o texto é zerado:
- Redação em branco
- Fuga ao tema
- Não atendimento ao gênero cobrado (dissertativo-argumentativo)
- Texto com extensão claramente abaixo do limite estabelecido nas instruções da prova
- Texto com elementos verbais ou visuais não relacionados com o tema da redação
Importante: Caso uma redação receber nota zero de um avaliador e nota diferente de zero de outro corretor, ela será submetida a uma terceira avaliação, seguindo os mesmos critérios estabelecidos para os casos de discrepância. Nessa terceira correção, serão aplicados os mesmos critérios de análise da redação.
Modelos de redação Fuvest para você se inspirar
Para te ajudar a desenvolver uma excelente redação e ingressar na USP, reunimos alguns exemplos de redação Fuvest que você precisa conferir. Leia abaixo:
2019: A importância do passado para a compreensão do presente
A proposta era produzir um texto sobre os impactos do passado no entendimento que se tem do presente.
Título: Releitura renascentista
Compondo uma extensa riqueza nacional, as escolas literárias brasileiras ficaram marcadas por realizarem, em algum nível, uma quebra com os padrões de produção escrita antecedentes. Essas constantes mudanças de rumo tomadas ao longo do tempo se pautaram em compreender urgências na substituição de conceitos ultrapassados. Nota-se, a partir disso, um claro exemplo da aplicabilidade do passado no entendimento do presente, princípio esse que deve se estender a todos os aspectos que compõem o cotidiano sociocultural humano.
A priori, é necessário frisar que, assim como há muito já afirmava o filósofo Edmund Burke, a falta de ampla compreensão acerca do passado implica em tendência à recorrência de seus erros no presente. A respeito disso, exemplifica-se hodiernamente uma constante perpetuação de preconceitos enraizados no Brasil, fato que está intimamente relacionado ao descaso em relação à manutenção do patrimônio histórico nacional – apenas 20% do capital necessário é destinado a essa área, de acordo com o canal de comunicação O Globo. Dessa maneira, comprova-se que a negligência do passado corrobora as incoerências do presente.
A posteriori, salienta-se o importante papel exercido pelo passado não somente em compreender o presente, como também em desenvolver aspirações futuras, sobretudo ideológicas. Com base nessa premissa, pode-se apontar para o Renascimento, cuja ligação com a cultura antiga viabilizou a efervescência da racionalidade e, consequentemente, a construção do mundo moderno. Toma-se, então, como relevante a conexão com o passado na fortificação das bases ideológicas para a construção dos tempos que ainda estão por vir.
Conclui-se, portanto, que o passado se configura como o parâmetro mais adequado a ser considerado na compreensão do presente e confecção do futuro, de forma que, ao ser adquirido amplo entendimento acerca de suas raízes históricas, todos os povos poderão, decerto, renascer sob influência delas, originando um futuro sem a recorrência de inconsistências.
2018: Devem existir limites para a arte?
A proposta era responder à seguinte questão: “Devem existir limites para a arte?”.
Título: Liberdade e respeito
A exposição de arte “Queermuseum”, apresentada em Porto Alegre, foi alvo de polêmicas no país, devido às inúmeras acusações de apologia à pedofilia e à zoofilia. Assim, fica claro que, apesar dos malefícios gerados pela limitação da arte, é necessário refletir sobre as possíveis infrações da lei, visto que no Código Penal do Brasil são condenadas certas incitações. Dessa forma, a análise acerca de tal problemática, intrinsecamente ligada a aspectos culturais, é necessária.
Por um lado, convém ressaltar os prejuízos provocados pela censura. Entre eles estão a ameaça à liberdade de expressão e o agravamento da alienação de indivíduos, uma vez que a remoção de informações da circulação pública corrobora para a ignorância e ausência de repertório cultural por muitos. Tal quadro é evidenciado pela manipulação social da massa resultante do veto de 1650 obras, durante o golpe militar, segundo o jornalista e escritor Zuerin Ventura.
Por outro lado, é válido lembrar que, de acordo com a Constituição brasileira, todos os princípios devem ser relativizados, ou seja, é preciso observar o contexto no qual determinada exibição artística enquadra-se, para que não se promova princípios ilegais. Sendo assim, casos como o da apresentação “La Betê”, na qual uma criança interagiu na performance do artista Wagner Shautz que estava nu, infringem a lei, visto que é crime permitir que um menor de dezoito anos frequente espetáculos capazes de pervertê-lo.
Portanto, percebe-se que a censura corrobora para uma sociedade sem liberdade de expressão, política e religiosa. Ainda assim, é notória a importância de garantir que a arte não viole qualquer lei, para impedir que outro indivíduo se sinta desrespeitado. Logo, garantir que tal equilíbrio ocorra, minimizará os casos de polêmica, envolvendo diferentes visões sobre determinada exposição, e ampliará o conhecimento cultural do país.
2015: “Camarotização” da sociedade brasileira: a segregação das classes sociais e a democracia
A proposta era redigir uma redação sobre a segregação de classes sociais distintas.
Título: “Camarotização”: a filha da desigualdade social
Conforme o artigo 5° da Constituição Brasileira, todos são iguais perante à lei, ou seja, todas as pessoas deveriam receber os mesmos direitos. Entretanto, essa norma não condiz com a realidade. Haja vista que, no Brasil, os indivíduos são separados em classes sociais, a “camarotização” se torna cada vez mais evidente. Com isso, de Engels, no século XIX, a Racionais, no final do século XX, ambos escancaram a horrenda segregação da população entre: os mais afortunados e os desfavorecidos.
Em primeiro plano, é cabível citar que Engels, no livro “A situação da classe trabalhadora na Inglaterra”, descreve os malefícios do avanço desenfreado do capitalismo sobre os trabalhadores. Tendo em vista que, por não existirem leis trabalhistas, os operários eram extremamente explorados. Em contrapartida a essa injustiça, a burguesia enriquecia imensuravelmente. Perante a isso, os burgueses tinham acesso aos melhores alimentos, às roupas de qualidade, às moradias decentes e luxuosas e, além disso, possuíam dinheiro e tempo para usufruir da cultura.
Ademais, considerando-se que essa disparidade não se restringiu à Inglaterra, no final do século XX, o grupo de “rap” Racionais Mc’s abala a sociedade com suas músicas que retratam a realidade da desigualdade social no Brasil. Assim, na obra “Fim de semana no parque”, os artistas explicitam as diferenças entre os brasileiros pobres e ricos, através de frases como “olha só aquele clube que da hora, olha o pretinho vendo tudo do lado de fora”. Com isso, conclui-se que os moradores da periferia representados como o “pretinho”, não compartilham dos benefícios das classes mais abastadas, como o clube citado na canção.
Infere-se, portanto, que, apesar da existência de leis, como o artigo 5° da Constituição supracitado, a “camarotização” da sociedade brasileira perdura até a atualidade. Em suma, torna-se imprescindível dizer que esse processo capitalista e elitista provém da hedionda disparidade social.
2014: Idosos
A proposta era avaliar as falas do então ministro de finanças do Japão, Taro Aso, que criticou o papel do Estado para com sua população de idosos, no que diz respeito às despesas médicas.
Título: Idosos são a raiz da sociedade
O discurso de Taro Aso propõe que os idosos devem morrer mais rapidamente para reduzir os gastos públicos. Dessa forma, ele apresenta diretamente, um dos reflexos da sociedade industrial, que é a liquidez moderna, que defende que tudo o que não gera ganho no momento tem que ser eliminado. Com isso, deixa-se de levar em consideração que idosos não são produtos do meio de produção, mas sim, pessoas.
Primeiro, deve-se ressaltar que esse discurso fere princípios da ética, já que pessoas que contribuíram tanto para a sociedade no passado não têm seus direitos assegurados e são tratadas como um peso. A ideia de contrato social ensina que partes da liberdade devem ser cedidas por todos os cidadãos para que os mesmos tenham direitos dentro da sociedade. Comparando com os idosos, que, em sua idade produtiva, trabalharam e fizeram o país crescer, a parte do “contrato” por parte do Estado não está sendo respeitada, já que os idosos têm direito ao apoio à saúde do Estado e ele está sendo limitado.
Em outro ponto, os idosos são fontes inestimáveis de conhecimento sobre a vida, tanto na visão filosófica como na prática, por já terem vivido mais e como consequência, aprendido mais. Reduzir os idosos a um “peso” faz com que a sociedade não apenas ignore seus direitos, mas também, a história da sociedade em que se vive. Com isso, deixa-se de aprender com os erros do passado e há o atraso do avanço da sociedade para o futuro como um todo.
Portanto, os idosos, que tanto contribuíram na construção do mundo atual e que podem ensinar tanto para o aprimoramento dos mais jovens como humanos, não devem ter seus direitos questionados, mas sim respeitados e honrados. Se não fosse por eles, a sociedade não teria chegado ao nível de desenvolvimento atual. Além disso, todos devem escutar com mais atenção ao que os idosos têm a falar, já que os idosos são as raízes de todas as sociedades.
Bônus: Temas das últimas edições
Para terminar, confira os temas cobrados nas 10 últimas provas da Fuvest:
- 2024: Educação básica e formação profissional: entre a multitarefa e a reflexão
- 2023: Refugiados ambientais e vulnerabilidade social
- 2022: As diferentes faces do riso
- 2021: O mundo contemporâneo está fora da ordem?
- 2020: O papel da ciência no mundo contemporâneo
- 2019: De que maneira o passado contribui para a compreensão do presente?
- 2018: Devem existir limites para a arte?
- 2017: O homem saiu de sua menoridade?
- 2016: As utopias: indispensáveis, inúteis ou nocivas?
- 2015: “Camarotização” da sociedade brasileira: a segregação das classes sociais e a democracia
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